quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

curtas


Rossio
Uma velha partiu o braço em três sítios. Pede-me uma moeda. Uma bola gigante de luzes lembra que é Natal no Rossio. Há também um anjo de braços abertos. Relembro o teu abraço.

Rua Augusta
Uma lindíssima e delicada mulher-estátua posa para as fotografias incrédulas e recebe muito poucas moedas. Mais à frente, a animada música do Kusturica ou o ar dos foles do Danças Ocultas compõem a banda sonora de um extraordinário artista de rua, anónimo e brilhante, a quem entrego todas as minhas moedas. Mais tarde, na leitaria que faz esquina no final da Rua das Portas de Santo Antão, eu sem um cêntimo para a meia de leite descafeinada que penso necessitar de beber e peço ao senhor do bigode que não tem multibanco. Pergunto-me: Querido Santo Antão, porque não aceitas, nos teus cafés, teatros, restaurantes o meu dinheiro do monopólio? Ou um poema, um desenho, um beijo de agradecimento? Odeio mesmo o capitalismo!

Metro
Gosto de sair à superfície e não fazer ideia de onde estou. Gosto de procurar os M's no meio da confusão das ruas. Gosto dos coelhos da Alice na Estação do Cais do Sodré. Gosto de andar num ritmo que parece completamente contra a corrente. Eu caminho. As pessoas correm. Eu não sou uma pessoa.

Químicos
Desde que, há anos, tomava aspirinas em jejum por causa de umas enxaquecas mortais, eu deixei os químicos para trás.
Há uns dias, terminei, com sentido de urgência, uma recusa aos antibióticos para a Macua.
Hoje, dois dias depois de começar a colocar diariamente uma potentes gotas nos olhos, sinto-os finalmente, depois de meses, desinchados. Ufa! Que alívio.
Começo a gostar de químicos!

Boa pessoa
O coração está cheio de amor e faz só o que quer.
Que mal há nisso?
Não deveria toda a gente fazer o mesmo, na construção da paz?

Pausa na linha
Depois de passar uma greve de comboios e andar 1 km a subir uma rua ao engano, chego finalmente ao "Pausa na Linha" da Manuela Ribas. Ali recebo e dou abraços que matam as saudades. Uma sopa quentinha reconforta-me o estômago depois da viagem. Ficaria a tarde toda nesta pausa. Bonita.
(19.Dez.2012)

Pátria
- "Hoje mudei de pátria para a tua pele." 
- E eu seria nómada em ti. No teu corpo, na tua alma, no teu olhar.
(21.Dez.2012)

Sem comentários:

Enviar um comentário